Babel

As palavras são uma fonte de mal-entendidos, já dizia o Príncipe de Exupéry. Façamos delas, então, os alicerces da Babel. Talvez cheguemos ao milagre das línguas, ao pentecostes. Words, words, words.

sábado, 11 de setembro de 2010

Intolerância

O fantasma das torres, de Jorge Cardoso


Recentemente, assisti a um filme chamado Intolerância (1916), do diretor D. W. Griffith. O filme é mudo, em preto-e-branco. Imaginei que ele seria entediante. Porém, enganei-me, pois sua temática mostrou-se, infelizmente, atual. De modo algum me cansei ao vê-lo. Em linhas gerais, o filme revela a intolerância em quatro momentos da História. Neste 11 de Setembro, data dos ataques ao World Trade Center, esse tema é pertinente.

Em duas narrativas, que versam sobre a queda do rei babilônico Baltazar e a Noite de São Bartolomeu, percebemos como indivíduos, com o objetivo de manter o poder político e social, são capazes de manipular preconceitos religiosos e provocar a morte de centenas - ou milhares - de pessoas, provocando guerras. As outras duas histórias do filme tratam não de conflitos entre povos, mas de situações mais bem individualizadas. Na Judeia, um grupo trama e condena um inocente, Jesus Cristo; nos Estados Unidos da América, pessoas que se acreditam melhores que as outras quase acabam com a vida de um jovem casal.

No Brasil, hoje, agora, essa intolerância, presente no meio das pessoas, cresce silenciosa, apodrece as relações e abre feridas. Ela, com riso que humilha e ódio que mata, rotula o diferente, como se a condiçao do outro fosse inferior e merecedora de condenação. A intolerância aniquila mulheres, negros, homossexuais, drogados, alcoólatras, presidiários, pobres, deficientes físicos e mentais, estrangeiros e tantos outros tidos como inferiores. Se não lhes tira literalmente a vida, compursca-lhes a dignidade por meio de mesquinharias: humilhações, risos, obstáculo a uma vida melhor. A crueldade humana manifesta-se tanto em grandes atentados, que dilaceram o corpo, como em pequenas ações de intolerância, que destroçam o íntimo do indivíduo.

Hoje, o 11 de Setembro nos lembra a intolerância. Que fizeram com parte do mundo muçulmano para haver tal atentado? Que explicação existe para a morte de tantos nas Torres Gêmeas? Por que usar o nome de Javé/Alá a fim de disseminar a destruição e a morte entre humanos? Por que tanto combustível para a intolerãncia? Certamente, não detenho conhecimento tão específico para responder a essas perguntas. Aqueles que possuem o poder político das Nações devem dar respostas a tais questionamentos para alcançar a tão mencionada e vilipendiada paz. A nós, cidadãos comuns, cabe crer na esperança, que, nesses casos, possui um nome muito específico: diplomacia. Não consigo imaginar a dor daqueles que, hoje, relembram seus mortos no 11 de Setembro e expõem o seu luto. Também não imagino o sofrimento daqueles que são vítimas de atitudes preconceituosas. A dor destes últimos, muitas vezes, é crônica.

O Cristo dos Evangelhos nos revela a tolerância; o Maomé do Alcorão também. Despir-se de todo preconceito, conhecer o outro e imaginar-se no lugar do outro são atitudes difíceis, mas necessárias para que haja uma sociedade em que a unidade, a justiça e a solidariedade sejam valores reais. Tolerância é o que vejo no meu Evangelho, na minha Torá e no meu Alcorão.



Hoje, comemoro o aniversário de um grande amigo: A. Mendes. Ele é uma das pessoas mais tolerantes que eu conheço.


Sobre o fundamentalismo nas três principais religioes atuais, aconselho a leitura do livro Em nome de Deus, de Karen Armstrong. O texto de Armstrong é esclarecedor.











3 comentários:

  1. Engraçado, se não trágico, é perceber que o próprio Griffith havia sido intolerante com os negros em seu filme anterior. Aí é que está o perigo desta "tolerância seletiva", que é o próprio preconceito em pele de cordeiro. O mesmo ocorre com o "politicamente correto", que mais parce uma indulgência forçada. A tolerância só existe quando é total, irrestrita e cega, a que não vê ninguém como privilegiado, por que enxerga a todos igualmente.

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  2. PS: Sobre o 11/9, sugiro a leitura do "À sombra das torres ausentes", de Art Spiegelman: http://www.universohq.com/quadrinhos/2004/review_sombra_torres_ausentes.cfm

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  3. É por demais delicado o tema... Somos tão ou mais intolerantes que um terrorista sem nem nos darmos conta. Há vícios, amarras, convenções sociais e, mesmo críticos, nos enredamos nesse emaranhado; somos vítimas e algozes muitas vezes.
    Gostei do seu texto, mas ainda há pontos que me soam discutíveis, como o argumento religioso.
    Um abraço, Van.
    Bom ter você e Eli no curso. Vocês me transmitem paz e segurança. Obrigada de coração.
    Lu

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