Babel

As palavras são uma fonte de mal-entendidos, já dizia o Príncipe de Exupéry. Façamos delas, então, os alicerces da Babel. Talvez cheguemos ao milagre das línguas, ao pentecostes. Words, words, words.

domingo, 23 de dezembro de 2012

Mais um Natal.

Árvore de Natal, Praça Portugal, Fortal.-CE
 
 

Este blogue não é religioso, apesar das inúmeras considerações sobre religião constantes em diversas postagens. Justifico isso pelo fato de, no Brasil, a religião cristã exercer influência em nossa sociedade, mesmo sobre indivíduos não religiosos ou ateus. Aqui, o Natal – a solenidade do nascimento – é uma grande festa religiosa. Ainda que exista a questão do consumismo, ainda permanece (ainda) o caráter espiritual da celebração.
 
Esse Natal é o mais diferente de todos por que já passei. Ainda que haja dois pequenos pinheiros e uma reprodução iconográfica da Sagrada Família, ambos postos como decoração por minha esposa, o maior símbolo natalino está no quarto ao lado da biblioteca: duas crianças nascidas há pouco mais de uma semana – meus filhos. Eles vieram ao mundo de maneira preocupante, pois a mãe apresentou um quadro de saúde de relevantes cuidados, assim o parto precisou ser antecipado. Nasceu o primeiro a 00h02 min de 14 de dezembro, o segundo veio à luz a 00h03min. Tivemos a ajuda solidária (há pleonasmo aqui?) de alguns amigos durante esse momento de tensão e durante esses primeiros dias de recentes maternidade e paternidade. Olhando para meus garotinhos, noto duas pessoas dependendo totalmente de mim. Isso desperta, sinceramente, uma inquietação. Não posso, ou, pelo menos, não quero, falhar com eles. Creio que essa preocupação com o outro, destacadamente com os filhos, é algo muito humano, demasido humano. Não há espiritualidade aqui.
 
A reflexão de Natal que proponho, ainda que baseada em narrativas míticas religiosas, busca fugir do espiritual e manter-se no humano. Escolhi o Evangelho de Mateus, cujo símbolo é um homem, por tratar do Jesus dito histórico, do Jesus-homem. Quero comentar muito brevemente alguns milagres expostos nesse texto bíblico. Enquanto tantos se impressionam mais com os anjos e a estrela que anunciam o nascimento de Cristo, penso que vale bem mais a pena ater-se à manjedoura e às pessoas que estão na cena do presépio.
 
Quando assisti ao filme Maria, a mãe do Filho de Deus (película ruim, por sinal), uma frase...
 
(Os gêmeos começaram a chorar, pausa para vê-los.)
 
... chamou-me  a atenção. Maria diz que gostaria que o filho dela não fizesse milagres, assim talvez as pessoas o buscassem somente pelo que ele dizia. Ou seja, a atitude de respeito para com o próximo. Grande parte dos milagres feitos por Jesus têm como resultado a recuperação da dignidade humana perdida. A lei mosaica legisla que todo portador de lepra seja lançado fora do arraial, da comunidade. Em Mateus, ao curar um leproso, considerado amaldiçoado, Jesus dá condições de que o doente volte ao convívio da comunidade, não mais como pária, mas como igual. Muitos, por olharem o milagre, não notam o que realmente importa: restabelecer o ser humano perante os outros
 
Ainda nesse Evangelho, lemos a narrativa da mulher que possuía um fluxo contínuo de sangue. Ora, a lei dizia que toda mulher com fluxo era impura, e todo aquele que a tocasse ou todo objeto por ela tocado eram impuros também. “Quando uma mulher tiver seu fluxo de sangue, ficará impura durante sete dias: qualquer um que a tocar será impuro até a tarde.” (Levítico 15,19) A mulher possuía o fluxo já havia 12 anos, tendo gastado seu dinheiro com médicos que não a curaram. Imaginemos os doze anos de vida excluída da comunidade, sem poder tocar nos seus entes queridos, afastada, discriminada, humilhada. Jesus a cura. De que maneira? Deixando-se tocar. Ou seja, em vez de se contaminar, como reza a lei, a mulher é curada, sua dignidade é recuperada.
 
Em nosso Brasil, está cada vez mais comum pastores e padres que dizem curar câncer, libertar da AIDS, expulsar demônios.  Não acredito neles, acredito em pessoas que realizam ações que trazem dignidade a grupos excluídos, rotulados, humilhados. Creio em pessoas que são solidárias; que não (apenas) rezam pelos outros, mas que agem em prol dos outros. É isto que quero ensinar aos meus filhos: a solidariedade. Quero que valorizem a vida humana e a dignidade do indivíduo, a deles inclusive. Gostaria que reconhecessem o Bom Samaritano como exemplo de vida.
 
Em um mundo tão individualista, como fazê-los, futuramente, pensar nos outros e buscar colocar-se no lugar do outro? Isso é motivo de inquietude. Espero que o Natal desperte essa preocupação em muitos.
 
 
O Bom Samaritano, de Claudio Pastro
 
 
Dedico esta postagem a Hildemara Amaral e Tony Fernandes, pela solidariedade dos últimos dias.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Machado de Assis no cemitério de Hamlet


Este artigo foi apresentado, de maneira resumida, como pôster no X Encontro de Pós-Graduação e Pesquisa, na Universidade de Fortaleza - UNIFOR, ocorrido de 20 a 23 de outubro de 2010. Abaixo, o link do artigo.