Quando se pensa em literatura, é
senso comum pensar em livros. Claro, há séculos o livro é o principal veículo
de divulgação da arte literária. É relação tão íntima que, ao se falar em
livros, pensa-se em literatura. Se alguém nos faz a pergunta “Qual livro você
está lendo?”, dificilmente alguém responderá “Estou lendo o Biologia 1, do
Amabis”, mas dirá, por exemplo, às vezes com um certo pedantismo, “O segundo
volume de À La recherche..., de
Proust. O livro, porém, é apenas um veículo. O papel, a capa, a lombada, enfim,
o objeto – com ou sem o charmoso aspecto de antigo, ou o nem sempre agradável
cheiro de mofo – não é mais imprescindível para a divulgação do texto
literário.
A internet trouxe a possibilidade
da multiplicação dos pães no que se refere à produção literária. Há vários sites de divulgação de contos e poesias,
por exemplo. Além de blogs de talentosos
escrevinhadores. E muitos autores produzem exclusivamente para este novo
veículo da literatura: a Web. Existe quem tenha a Internet como um entreposto
importante entre a antiga gaveta de inéditos e a consagração proporcionada pelo
livro. Segundo o Estadão, no artigo “Internet renova a literatura do século 21”, Daniel Galera é um dos principais nomes dessa
nova geração de literatos. Ele surgiu em 1998, em Porto Alegre, no fanzine via
e-mail CardosOnline e fundou, já em 2001, o selo independente Livros do Mal
(junto com outro escritor, Daniel “Mojo” Pellizzari). Hoje, Galera publica pela
editora Companhia das Letras, teve seu segundo livro adaptado para o cinema
pelo diretor Beto Brant (Cão Sem Dono, em cartaz).
Se tantos, todavia, buscam ainda
a consagração de sua arte “on-line” através do papel, pois a simbologia do
objeto livro ainda é marcante (sem esquecer outro símbolo de papel: o dinheiro),
é fecunda para a literatura a produção artística via Internet. Se não se pode
viver somente de literatura e o autor vive em um na-lugar – lembro aqui a paratopia
do escritor –, a rede mundial de computadores destrói as barreiras e alarga
imensamente as possibilidades de leitura, conhecimento e fruição de textos. Se
não há (ainda) tanto ganho material para o autor com a literatura na Internet, há ganho
imensurável para os leitores, que se esbaldarão em textos artísticos, não raro,
cheios de qualidade.
Como exemplo, cito um conto que
li recentemente chamado Revolution (ou
como o MST não destrói apenas pés de laranjas), de Filipe Teixeira,
escritor que publica no site Recanto
das Letras. Esse texto, no entanto, me foi mostrado em um fanzine, que, apesar
de utilizar o papel como veículo, não tem o status
de livro. (Será a internet um grande fanzine?) O conto tem sensibilidade, e os
recursos estilísticos, mesmo sendo deveras utilizados por tantos, possuem algo
de singular. Se conseguir autorização do autor, talvez eu o publique neste meu blog e teça outras considerações.
Muitos ainda consideram a
publicação de um livro a certidão de batismo de um escritor, mas quem disse que
só se vive depois de ser batizado? O escritor já existe. Aliás, para que pensar
mesmo em escritor se o que vale mais é o texto e ele está ali, bem próximo? No
papel de uma grande editora ou na tela anônima de inúmeros leitores, há Literatura.